De todos os grupos musculares que os bodybuilders querem que cresça, as
panturrilhas tradicionalmente são um dos mais difíceis. De fato, é até
considerado que ter panturrilhas grandes é uma questão de genética – ou você
tem, ou não tem.
E, por razões que você lerá abaixo, há certamente um elemento de verdade
nisso. Indivíduos com grandes panturrilhas usualmente não as treinam de forma
alguma, enquanto outros treinam até não poder mais, e sem sucesso.
O que realmente acontece?
Bem, uma série de coisas. Neste artigo, eu quero primeiramente olhar a
fisiologia das panturrilhas, bem como examinar por que elas tendem a ser tão
resistentes a crescer. Finalmente, irei observar os erros de treino mais
comuns, que simplesmente contribuem para o problema.
Anatomia das panturrilhas e tipos de
fibras
O grupo muscular referido como panturrilhas inclui diversos músculos,
embora a maioria foque em apenas dois: o gastrocnêmio e o sóleo. A função
principal destes músculos é atuar como flexores plantares, embora o
gastrocnêmio também possua uma pequena atividade como flexor de joelhos (e é
por isso que algumas pessoas têm cãibras nas panturrilhas quando fazem
movimentos de flexão de pernas).
É por isto, também, que trabalhar as panturrilhas com as pernas dobradas
(sentado) tende a exercitar preferencialmente o sóleo. Como o gastrocnêmio
cruza o joelho, se ele estiver dobrado o gastrocnêmio não consegue contribuir
significativamente para produzir força. Funciona assim: se você fizer o
exercício com as pernas esticadas, irá trabalhar gastrocnêmio e sóleo; se fizer
com elas dobradas, apenas o sóleo.
Anatomicamente, o sóleo se localiza “por baixo” do gastrocnêmio, mas
ambos dão às panturrilhas a forma de “diamante” (quando desenvolvidas).
Muitas pessoas ainda acreditam que os músculos das panturrilhas são de
contração lenta, mas isto está incorreto. O gastrocnêmio, na realidade, é de
contração rápida, e está envolvido em movimentos explosivos.
O sóleo é predominantemente um músculo de contração lenta, pois está
mais envolvido com estabilidade geral do tornozelo. A diferença nos tipos de
fibras do gastrocnêmio e do sóleo tem implicações para o treinamento que eu
irei me referir ao final do artigo.
Também gostaria de notar outra questão com as panturrilhas, que tem a
ver com o pequeno braço de alavanca do tendão de aquiles em referência ao
tornozelo (eixo de rotação). Por causa da anatomia específica das panturrilhas,
um músculo relativamente pequeno consegue gerar uma força enorme ao longo do
tornozelo. Esta é uma das razões pelas quais as pessoas conseguem usar cargas
extremamente altas quando exercitam as panturrilhas (além de um outro motivo,
que eu irei comentar abaixo).
Então, por que é tão difícil?
Eu até hoje não vi nada que sugira que as panturrilhas são geneticamente
resistentes ao crescimento, mas há um pouco conhecido fator biológico sobre
panturrilhas que contribui com a dificuldade em fazê-las crescer.
Eu estou presumindo que todos que lêem este artigo conhecem ou ouviram
falar de receptores androgênicos (RA). É nestes receptores que a testosterona e
outras moléculas relacionadas se ligam e um dos efeitos é estimular a síntese
de proteínas. Em homens, há um padrão distinto de RAs, tendo uma densidade
maior nos membros superiores (especialmente trapézios e ombros, um dos motivos
pelos quais quem usa esteróides costuma ter um crescimento absurdo nestes
músculos), diminuindo até os membros inferiores. Se você pensar assim, isto faz
sentido, uma vez que o formato em “V” com ombros largos é mais ou menos o
físico “ideal”, e nós evoluímos assim por uma razão.
Na hora em que você chega às panturrilhas, a densidade de RAs é bastante
baixa. Então, mesmo que você treine absurdamente elas, o treino simplesmente
não terá o mesmo resultado, porque a testosterona não consegue exercer tanto
efeito. Esta é parte das razões pelas quais é tão difícil desenvolver as
panturrilhas.
O que nós podemos aprender com os
cangurus
Há um outro aspecto da função das panturrilhas que muitos ignoram, mas
eu penso que contribui massivamente para a inabilidade completa de muitas
pessoas em desenolver as panturrilhas. Todo mundo lendo isto já esteve em uma
academia e viu pessoas bastante magras usando cargas altas em um exercício de
panturrilhas, sem parecer fazer grande esforço. Elas não conseguem fazer isso
em nenhum outro exercício; você já parou para imaginar o porquê?
Para entender o que eu irei explicar, eu preciso falar sobre tecido
elástico, e como ele armazena e libera energia. Tecidos como tendões são
elásticos (ou seja, eles podem se estender/deformar e voltar ao normal depois).
Se você colocar carga neles rapidamente (por exemplo, com uma fase excêntrica
rápida) eles armazenam energia, que pode ser liberada de volta se você se mover
rápido o suficiente. Esta é parte da razão pela qual é sempre
mais fácil de executar o movimento do supino se a barra “quicar” ao invés de
parar e depois subir novamente. Então, lembre-se disto: tecidos elásticos
conseguem armazenar energia e liberá-la se você se mover rápido o suficiente.
E isto nos leva aos cangurus. Já viu um canguru pular, e o quanto eles
“quicam”? Como se vê, quando cangurus pulam por uma certa distância, eles o
fazem em uma frequência específica. E pesquisas mostram que esta frequência
permite a eles carregar os tendões atrás das pernas de forma a conseguir uma
imensa recuperação de energia elástica; isto os permite ir em frente por longos
períodos sem usar muita energia muscular. É extremamente eficiente, porque
tendões não se cansam facilmente.
Você entendeu onde eu quero chegar? O tendão de aquiles humano, o tecido
elástico conectando as panturrilhas ao calcanhar funciona similarmente (mas nem
perto da magnitude dos tendões dos cangurus). Esta é uma adaptação à locomoção
humana, quando você caminha e a canela se move para a frente, ela carrega o
tendão de aquiles, o que te dá um pouco de energia de volta, poupando energia
para caminhar e correr.
O que você acha que acontece quando uma pessoa treina as panturrilhas
“quicando” (descendo e subindo rapidamente)? Isto mesmo, elas estão basicamente
utilizando o potencial de retorno de energia das pernas para mover cargas
enormes sem fazer muito trabalho muscular; e como a combinação de tensão e
trabalho é o que estimula o crescimento… genética não é a única razão pelas
quais muitas pessoas não desenvolvem as panturrilhas. Muitas pessoas apenas
treinam as panturrilhas terrivelmente.
Eu creio que foi daqui que surgiu a idéia de fazer muitas repetições
para panturrilhas: quando você quica, você faz uma pequena quantidade de
trabalho muscular com cada repetição; então, precisa fazer dezenas ou centenas
de repetições para ter algum estímulo.
Logicamente, há uma solução bem mais fácil; você provavelmente já
adivinhou o que é, e isto me leva à próxima seção: como treinar as
panturrilhas.
Como Treinar as Panturrilhas
Primeiramente, vamos resumir o que eu falei:
·
O gastrocnêmio é principalmente um músculo de fibras de contração rápida
·
O sóleo é principalmente um músculo de fibras de contração lenta
·
Se você se exercitar com as pernas esticadas, irá trabalhar o sóleo e o gastrocnêmio
·
Se você se exercitar com as pernas dobradas, irá trabalhar somente o
sóleo
·
Quando você “quica”, o tendão de aquiles faz a maior parte (senão tudo)
do trabalho, e as panturrilhas não fazem quase nada
Eu não mencionei nada sobre densidade de receptores androgênicos porque,
além de tomar esteróides o ano todo, não há nada que você possa fazer quanto a
isto. Mas, com treino correto, nós podemos considerar tudo o que está acima.
Primeiramente, aqui está minha rotina de treinos padrão para panturrilhas.
Um exercício com pernas esticadas: 5 séries de 5 repetições feitas da
seguinte forma.
A partir de uma pausa de 2 segundos, exploda esticando as pernas, segure
por 1 segundo no topo, e desça na fase excêntrica durante 3 segundos (isto
seria escrito como X/1/3/2: concêntrica explosiva, 1 segundo no topo,
excêntrica em 3 segundos, e mais 2 segundos na parte de baixo com as pernas
esticadas). Descanse 3 minutos entre as séries e use cargas pesadas.
Quando você conseguir 5 séries de 5, aumente a carga para o treino seguinte. O
gastrocnêmio é um músculo de fibras de contração rápida, ele responde melhor a
cargas altas. A fase concêntrica explosiva irá maximizar a tensão; a parada no
topo garante que você está controlando o peso, e a descida controlada é crítica
para o crescimento. Nota: cuide na pausa ao final do movimento, não alongue
demais as panturrilhas ou você pode ter fascite plantar. Mas também não diminua
a amplitude do movimento. Você deve alongar um pouco as panturrilhas, apenas
não demais.
A seguir:
Um exercício com as pernas dobradas: 3-4 sets de 8-10 repetições feitas
da seguinte forma.
A partir de uma pausa de 2 segundos, suba controladamente em 2 segundos,
pause por 1 segundo no topo, e desça controladamente em 2 segundos
(2/1/2/2). Descanse 60-90 segundos e use o máximo de carga que conseguir
com boa execução – talvez você precise diminuir a carga após cada série devido
à fadiga. Por ser composto de fibras de contração lenta, o sóleo responde
melhor a séries longas e estímulo de fadiga. Isto deverá doer pra caramba.
De forma mais clara:
·
Panturrilha com pernas esticadas:: 5X5/3′ descanso com ritmo X/1/3/2
·
Panturrilhas com pernas dobradas: 3-4X8-10/60-90″ de descanso com ritmo
2/1/2/2
É isto. Faça a rotina acima duas vezes por semana (ou a cada 5 dias se
tiver recuperação ruim), após seu treino de pernas. Ah sim, e você precisa
estar ganhando peso para desenvolver suas panturrilhas (ou qualquer outra parte
do corpo). Você não irá criar músculos sem excedente calórico, e, se você não
estiver ganhando peso enquanto faz a rotina acima, você não irá desenvolver
nenhum músculo.
Faça a rotina em um ciclo de 8 semanas, começando com 2 semanas com
cargas submáximas (você provavelmente não conseguirá andar por uma semana se
não estiver acostumado a trabalhar panturrilhas com pausa na parte de baixo).
Após 8 semanas, diminua as cargas por duas semanas e comece novamente.
Eu não posso garantir que a rotina acima irá transformar radicalmente
suas panturrilhas, mas, comparado com como 99% das pessoas treinam suas
panturrilhas, a rotina acima, combinada com um excedente calórico certamente
irá ajudar.
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